A APDA comprometeu-se, através do SENAG – Seminário Nacional de Abastecimento de Água, a exortar e a debater as questões e desafios mais prementes do setor sob diferentes perspetivas. Os números deste evento, que decorreu no Hotel Templários, em Tomar, entre os dias 2 e 3 deste mês de outubro, falam por si: mais de 400 participantes; 121 entidades representadas; 55 oradores; 11 sessões, incluindo a cerimónia da ERSAR, que distinguiu 83 entidades em baixa com o “Selo da qualidade exemplar de água para consumo humano”; 19 patrocinadores; e 17 expositores.
Com a solução, ou pelo menos a mitigação, de muitas problemáticas a passarem pela própria gestão dos serviços, com fatias efetivas e reais de investimento a diversos níveis, alinhamento de estratégias, sem esquecer a (co)responsabilidade do consumidor, ficou assente que é imperativo agir. Agir face às as situações que persistem - como as perdas de água, que inclui a longa parcela da água não faturada, o tempo de vida útil das infraestruturas (largamente ultrapassado); a sustentabilidade financeira do setor e a governança dos recursos hídricos -, mas também perante as novas que emergem a uma velocidade avassaladora - como as alterações climáticas e a (não)retenção de recursos humanos no setor (que, a olho nu, é uma questão facilmente superável comparando com a das alterações climáticas), as novas leis e regulamentos (cada vez mais exigentes), bem como a evolução tecnológica, designadamente da inteligência artificial (que se bem acompanhada, gerida e planeada torna-se numa mais-valia para o setor, ao invés de um obstáculo).
Quanto à governança dos recursos hídricos, importa sublinhar a concretização da revisão da Convenção de Albufeira entre Portugal e Espanha para garantir os caudais ecológicos dos rios Tejo e Guadiana, anunciada pelo Secretário de Estado do Ambiente, durante o SENAG. “Uma decisão difícil, que muita gente considerava impossível de conseguir”, mas viável com a “boa vontade de ambas as partes”, afirmou Emídio Sousa na sua intervenção, onde também reforçou a importância de revisitar o Plano Nacional da Água. Acrescentaríamos a urgência da implementação do PNUEA - Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água, aprovado para o período 2012-2020, com o intuito de contribuir para minimizar os riscos de escassez e melhorar as condições ambientais nos meios hídricos, sem colocar em causa as necessidades vitais e a qualidade de vida das populações, bem como o desenvolvimento socioeconómico do país.
Relativamente à sustentabilidade financeira do setor, e refletindo o panorama que mais de metade das entidades gestoras não cobrem custos e que por lei (nacional e europeia) é obrigatório o princípio do consumidor-pagador, o aumento da tarifa da água é uma das medidas em cima da mesa. Todavia, é fundamental encontrar fontes de financiamento alternativas para as entidades gestoras, já que o ónus não pode recair apenas sobre o consumidor, pois tal seria injusto. Ainda sobre este ponto, foi salvaguardada a importância do alinhamento de estratégias entre e para as entidades gestoras, designadamente municípios, que devem deter poder autónomo, não obstante às linhas de orientação. Neste âmbito, foi lançado à ERSAR o repto de ser mais interventiva, porque, para além de ser a entidade indicada para tal, a assimetria que existe entre entidades gestora assim o exige.
A preocupação com os recursos humanos no setor foi igualmente manifestada, uma vez que os últimos anos têm sido marcados pela saída de diversos profissionais. Para além dos que seguem a via natural da aposentação, são os quadros jovens qualificados que mais perdem o interesse no setor, seja pela perspetiva de evolução, seja pela de reconhecimento salarial. Um verdadeiro drama para o setor, tendo em conta o nível de sabedoria e
know-how existente nas organizações que fica, desta forma, em risco de não ser transmitido entre gerações, um problema agravado pelas regras vigentes no setor público. Em risco fica também o caminho da inovação.
No que à redução de perdas reais e aparentes diz respeito, sobre a qual diversas entidades partilharam as melhores práticas, o veredito é mais do que conhecido e consensual em todo o setor: é crítico mobilizar investimentos significativos para os ativos, uma vez que as infraestruturas existentes, com praticamente meio século, estão aquém da eficiência hídrica, prejudicado substancialmente a sustentabilidade económica, financeira e ambiental dos serviços de abastecimento de água.
Em suma, o SENAG veio despertar a dimensão do trabalho que nos espera, que se preconiza assustador, mas possível. Com os maiores desafios identificados, práticas testadas e planos desenvolvidos, o ingrediente necessário é a atuação conjunta do setor, tendo como aliado a vontade política em busca do mesmo fim: um setor eficiente e sustentável, pelo qual somos todos responsáveis. A APDA mantém-se atenta e na linha da frente.
Esperamos pelo próximo seminário nacional em 2026, desta vez dedicado às águas residuais (SENAR).
José Martins Soares
Presidente do Conselho Diretivo da APDA